Neste sábado
(12) é observado o Dia das Crianças. Num mundo altamente conectado e com a
tecnologia avançando a cada dia, os desafios para os pais e responsáveis é cada
vez maior nesse quesito.
Para ter uma
ideia, a população inteira da França, Itália e Grécia,
juntas, não corresponde à quantidade de brasileiros conectados à internet:
cerca de 149 milhões de usuários. Desse total, aproximadamente 142 milhões
utilizam a internet diariamente. Esse elevado índice não exclui os jovens e
crianças, como mostra pesquisa TicKids Online, divulgada pelo Comitê Gestor da
Internet no Brasil. De acordo com o estudo, 95% da população entre 9 e 17 anos
é usuária de internet no Brasil, valor que corresponde a 25 milhões de pessoas.
O estudo, que já está em sua 10ª edição, entrevistou 2.704
crianças e adolescentes, entre 9 e 17 anos.
De acordo com a pesquisa, os
usos da internet variam desde escutar música em sites e aplicativos até enviar
fotos e vídeos a desconhecidos. A maioria dos acessos é através do celular e
boa parte possui redes sociais. Além disso, mais de 30% das crianças e
adolescentes entrevistados nunca, ou quase nunca, se preocuparam com a
privacidade na internet e já viveram situações em que se sentiram ofendidas ou
chateadas.
Mesmo que pesquisa do IBGE
aponte que pela primeira vez em sete anos o uso da internet por crianças de 10 a 13 caiu, o percentual ainda é muito alto. Fatia de
brasileiros que têm celular nessa faixa etária ficou estável
EXPOSIÇÃO
A psicóloga educacional Milena Fontana da Luz, afirma que
os pais precisam compreender que não
existe exposição segura quando se fala em acesso a telas. “É muito perceptível
que, atualmente, as famílias estão mais atarefadas e possuem muitas questões
para "dar conta", entretanto, permitir aos filhos o acesso irrestrito
à tecnologia é prejudicial para o desenvolvimento físico, motor, cognitivo e
emocional deles”.
Segundo ela,
conciliar isso não é uma tarefa simples, pensando em uma família que trabalha o
dia todo e quando chega em casa ainda precisa sanar as questões domésticas,
todavia é essencial que se busque constantemente um equilíbrio nesse aspecto. “Um
belo exemplo é incluir as crianças e adolescentes nas atividades domésticas, as
crianças pequenas possuem uma pré-disposição para ajudar, eles gostam de se
sentir úteis”.
Mas como
aplicar isso no dia a dia de maneira concreta? Na visão da psicóloga, pedindo
ajuda para guardar a louça, arrumar a mesa, tirar o lixo, guardar os brinquedos
e todas as tarefas que a criança é capaz de realizar. “Maria Montessori sempre
deixou claro seu ponto de vista: “nunca ajude uma
criança em uma tarefa que ela sente que pode realizar sozinha”. Então perceba que o
fato vai muito além de mandar que a criança faça, trata-se de incluí-la,
ensiná-la e fazer dessa atividade um momento de conexão entre a família,
criando memórias para toda a vida, autoconfiança e autoestima”.
CONSEQUÊNCIAS
Milena
salienta que não podemos pensar que esse uso sem freio da tecnologia não traz
consequências e que quando a adolescência chegar simplesmente o cérebro vai
fazer um "clic" e aquele indivíduo vai perceber que precisa
contribuir para a ordem do lar. “É responsabilidade dos pais ajudar os filhos a
se desenvolverem em todos os seus aspectos. Recentemente li sobre um estudo
interessante feito pela universidade de Harvard que acompanhou crianças ao
longo de seu desenvolvimento e concluiu que as crianças inseridas em atividades
domésticas apresentavam maior autoestima e independência comparado com as
demais crianças. O que fica claro aqui é o fato que a criança não ajuda para
"aliviar" os pais, o que está em jogo é o desenvolvimento global da
criança”.
DEPENDÊNCIA
Sobre a
questão da dependência que atinge adultos, a psicóloga entende que o cérebro
anseia pelo que é mais prazeroso: “Exatamente por esse motivo que é muito
difícil manter uma rotina saudável ou comer um frango grelhado ao invés de uma
pizza. Nosso cérebro quer recompensas custe o que custar (mesmo que no fim das
contas isso seja prejudicial para ele mesmo). Com as crianças não é diferente e
posso afirmar que é ainda pior: pois nós adultos ainda podemos controlar nosso
querer e saber o que é melhor para nós mesmo, a criança não; ela ainda não
possui capacidades cognitivas para antever consequências e decidir de forma
racional o que é melhor para ela. Essa é a grande tarefa dos pais”.
ATENDIMENTO
Milena
Fontana da Luz (CRP 07/38607) realiza atendimento de orientações de pais
on-line pelo telefone (55) 99622-0343.
Os grandes desafios do ambiente virtual
Na avaliação
da psicóloga, o maior risco desse ambiente virtual é a exposição de conteúdos
inadequados para a faixa etária. “Não é raro ouvir falas como "no freefire (jogo online) estavam
perguntando onde eu morava" ou "pediram fotos do meu primo e
ofereceram diamantes para ele", esses são alguns exemplos do que já ouvi
durante minha prática educacional”.
Alerta que as
crianças e adolescentes não possuem maturidade para lidar com um ambiente
digital, muitas vezes os diálogos mantidos nesses aplicativos são obscenos,
vulgares e podem aflorar traumas e crenças que a criança vai carregar por toda
sua vida. “É comum também as crianças reproduzirem tiques ou expressões como
nos vídeos (modos de falar, caretas e/ou danças repetitivas). Sem contar que
plataformas como o Tiktok não possuem
um filtro eficiente dos conteúdos, podendo sexualizar as crianças e
adolescentes.Crianças e adolescentes não possuem maturidade e filtros sociais
para compreender tudo o que passa aos seus olhos pela tela do celular, é
obrigação dos pais estarem atentos e zelosos pela saúde de seus filhos”.
Mais ansiedade e menos tolerância às frustrações
A psicóloga
avalia que é muito perceptível a forma como a exposição tecnológica afeta cada
fase do desenvolvimento. “Crianças ficam muito agitadas, irritadas e não
aceitam seguir ordens na grande maioria dos casos. Já ao entrar na adolescência
percebe-se jovens mais quietos, que não querem interagir, apáticos e que muitas
vezes não mantêm convivência dentro do âmbito familiar. Ficam isolados no
quarto, por exemplo”.
Observa que o
que se percebe claramente nos dois grupos é a baixa tolerância à frustração. “Crianças
e adolescentes não são treinados para exercitar a paciência, a concentração e a
memória, não possuem mecanismos internos para lidar com a escassez e com o não
dos pais. Para esse último ponto gosto de fazer uma correlação simples: vídeos
curtos (muitas vezes com 15 segundos de duração), acesso sem moderação de tempo
e supervisão de conteúdos. Em resumo: a facilidade, é muito fácil ganhar um
celular, é muito fácil consumir por horas a fio conteúdos feitos para prender a
atenção e é fácil se esquivar de outras atividades”.
Ela orienta
que existem alguns recursos que podem auxiliar os pais nesse caminho de monitoramento
e diminuição do tempo de uso de telas, como aplicativos de controle e bloqueio
do celular do filho. “Acredito que o mais eficaz é o diálogo, franco e aberto,
mostrando para a criança ou adolescente os riscos e os perigos de entrar nesse
“mundo tecnológico”, a presença é o melhor aliado dos pais nessa batalha e com
confiança mútua é possível construir uma convivência agradável e segura nos
ambientes virtuais”.
Ressalta
ainda que a confiança entre pais e filhos deve ser construída desde a tenra
idade. “Desde pequenas as crianças precisam perceber que existe uma hierarquia,
regras a serem cumpridas e um adulto que está disponível para ajudá-la e
ensiná-la a crescer. Na medida em que a criança vai se desenvolvendo ela vai
aprendendo, ou seja, aprendizado e desenvolvimento não podem ser dissociados,
eles são partes do todo”.