Era uma vez um velho muito velho,
quase cego e surdo, com os joelhos tremendo. Quando se sentava à mesa para
comer, mal conseguia segurar a colher. Derramava sopa na toalha e, quando,
afinal, acertava a boca, deixava sempre cair um bocado pelos cantos.
O filho e a nora dele achavam que era
uma porcaria e ficavam com nojo. Finalmente, acabaram fazendo o velho se sentar
num canto atrás do fogão. Levavam comida para ele numa gamela de barro e – o
que era pior – nem lhe davam o bastante.
O velho olhava para a mesa com os
olhos compridos, muitas vezes cheios de lágrimas. Um dia, suas mãos tremeram
tanto que ele deixou a tigela cair no chão e ela se quebrou. A nora ralhou com ele, que não disse nada, só suspirou. Depois
ela comprou uma gamela de madeira bem baratinha e era aí que ele tinha de
comer.
Um dia, quando estavam todos sentados
na cozinha, o neto do velho, que era um menino de quatro anos, estava brincando
com uns pedaços de pau.
– O que é que você está fazendo?
– perguntou o pai.
O menino respondeu:
– Estou fazendo um cocho para papai e
mamãe poderem comer quando eu crescer.
O marido e a mulher se olharam durante
algum tempo e caíram no choro. Depois disso, trouxeram o avô de volta para a
mesa. Desde então passaram a comer todos juntos e, mesmo quando o velho derramava
alguma coisa, ninguém dizia nada.
O texto acima foi escrito pelos Irmãos
Grimm e traduzido por Ana Maria Machado, grande escritora brasileira. Encontra-se
em O Livro das Virtudes, de William
J. Bennett, volume 1, à página 102. Os dois volumes dos livros com o mesmo
título contêm dezenas de textos em prosa
e em poema cheios de virtudes e perpassados em alto engenho e arte literária. Merecem
leituras de todos os estudantes de oitavas séries para cima e de todos os
demais cidadãos.
Assim, na evocação do texto, que traz
fato acontecido no passado ao presente, e na sugestão, que sugere o fato do
presente ao futuro, faz bem dizer quão bom seria se na Terra não houvesse mais
um sequer vovô, sogro e pai nem sequer mais uma vovó, sogra e mãe sofrendo o
que sofreu na casa familiar, ou ainda mais e pior, o vovô, sogro e pai da história narrada pelos
germânicos Irmãos Grimm.