Publicado em 11/07/2024 às 16:22

Morrer de futebol

Na manhã melancólica, triste, cinza, gélida, umedecida, lentamente invernal, escutando Luiz Melodia, pensava no atual cenário do futebol brasileiro.

O timbre singular na vitrola aquecia as memórias futebolísticas: “eu fico com essa dor / ou essa dor tem que morrer / a dor que nos ensina / e a vontade de não ter ... eu morro de amores / ou preciso aprender”.

A canção, por algum motivo, trouxe à lembrança as dores das paixões esportivas, o gosto de solidão nos amanheceres e as abundantes lágrimas nas derrotas injustas.

O futebol ensinava-nos a sofrer.

A bola na trave, o impedimento marcado, o pênalti não convertido e o gol desperdiçado faziam parte dos necessários desamores juvenis, talvez, naquela época, tudo não passasse de uma infantil ilusão.

Não compreendíamos a derrota que chegava aguda no apito final. “Jogamos tão bem, e perdemos!” O narrador tornava o padecer algo épico na desclassificação.

Na arquibancada, o delírio difuso; no bar, o sofrimento coletivo. A regra no futebol é perder, não ser campeão. Como então escolhemos amar algo que nos fazia sofrer?

Agora, estranhamente, comemoramos a honrosa vaga na copa tal. Será que perdemos o desejo da taça no armário? As pulsões de vida e morte nas quatro linhas tornaram-se um negócio repleto de negociatas que desprezam o taciturno torcedor.

A sociabilidade no futebol também mudou: torcedores excluídos, consumidores falhos.

Os românticos alambrados desapareceram. O imaginário do menino descalço, descamisado, que chutava a bola sem marca na rua empoeirada não é mais o mesmo, talvez apenas um pesadelo neocolonial.

Os ídolos não possuem apelidos. Eles têm nomes compostos foneticamente monetizáveis – “Pobre narrador!”. Perdemos a brasilidade que, aos dribles, construiu o estilo brasileiro de jogar futebol, e importamos treinadores.

O amanhecer descolorido possuía as cores do sofrer. Senti um pouco de saudade das derrotas que causavam dores miúdas no coração; queria tanto morrer de amor, mas não senti nada, nenhuma dor, acho que nunca mais morrerei de futebol.

               

               

                



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