Anastácio, solitário, mateava na
coxilha.
Alguém sangrava uma milonga
desconhecida na oito baixos. A melodia trazida pelo vento parecia Milonga para
as Missões, embora faltasse alguma nota naquela sinfonia natural, talvez o sol.
A coxilha é um lugar de saudades,
pensava o domador ao observar o cemitério de campanha no horizonte. As antigas
cruzes confidenciavam sobre o passado de vidas desiguais, como em Jayme.
Anastácio não se preocupava com a
nostalgia do alvorecer. Sabia que a sanga logo arrastaria a dor no devaneio de
tornar-se mar. O peão não compreendia o estranho nevoeiro do amanhecer. Desde
guri, as manhãs significavam o sol tostando sua pele negra.
Os olhos contemplavam o voo da
borboletinha. Anastácio encantava-se com o bailar delicado das asas amarelas,
talvez imaginasse rodopios elegantes de uma bailarina.
Nos entardeceres, apreciava os
matizes do banhado, enredava-se em sonhos dourados sem a vilania dos metais,
apenas a ternura do bem-querer em sóis eternos. Na boca da noite, às vezes
pensava que a dança dos pirilampos bastavam à felicidade no campo.
Anastácio, que era acostumado com
o verde tocando seu corpo nas sesteadas, não conseguia entender as ausências do
céu, mas sabia que tudo poderia ser resolvido com o braço forte.
No lombo da tordilha, tantas
vezes havia laçado a lua para os poetas. Outras tantas, maneado a lua prateada
para entregar versos às prendas de olhares escuros em noites delirantes.
O pensamento de Anastácio não
alcançava os rios entristecidos do norte, desaguados, sem vida, tampouco as encarvoadas
florestas. Para ele, preservar o amanhã era saborear eternamente a sanga
cristalina nas tardes quentes.
Domar o sol esmaecido não seria
algo difícil para o domador. O luzeiro sem fim repousaria nos campos de canola,
como um potro a sentir carinhos depois do ventre.
Anastácio encilhou a tordilha na
sombra da bergamoteira. A égua, madrinha dos destinos, não faltaria ao
bicharedo sem luz, buscaria, em galopes, os amanheceres ensolarados.